Temas como igualdade de gênero e relações homoafetivas se destacam na sessão de posse da desembargadora federal Cláudia Franco no TRF2

Mais de 300 pessoas, entre desembargadores, juízes, procuradores da República, defensores, representantes dos poderes Executivo e Legislativo, advogados, militares e servidores da Justiça lotaram o plenário do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), no final da tarde desta quinta-feira, 13/02, no Rio de Janeiro, para a sessão solene em homenagem à posse da desembargadora federal Cláudia Franco. A magistrada foi conduzida até seu lugar na bancada pela decana Vera Lúcia Lima e pelo mais novo membro desta Corte, o desembargador federal Rogério Tobias. Em seguida, Maria Etatiane Costa Franco, mulher de Cláudia, foi homenageada com um buquê de flores. Além do presidente do TRF2, desembargador federal Guilherme Calmon, compuseram a mesa os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Benedito Gonçalves, Messod Azulay Neto e Daniela Teixeira e o procurador-chefe Leonardo Cardoso de Freitas, da Procuradoria Regional da República da 2ª Região.

Prestigiaram a posse, pelo TRF2, o vice-presidente, desembargador federal Aluisio Mendes; a corregedora regional da Justiça Federal da 2ª Região, desembargadora federal Leticia De Santis  Mello; os desembargadores federais André Fontes, Luiz Antônio Soares, Guilherme Couto, Ferreira Neves, Luiz Paulo Araújo, Marcus Abraham, Ricardo Perlingeiro, Marcelo Granado,  William Douglas, Flávio Lucas, Firly Nascimento; a desembargadora federal Andréa Esmeraldo e os desembargadores federais  Wanderley Sanan Dantas, Júdice Neto, Luiz Norton e Alfredo Hilário.

Professora de Direito Civil da UFRJ e do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito da Universidade Veiga de Almeida, autora do livro “Controvérsias: Entre o direito de Moradia em Favelas e o Direito de Propriedade”, que fala sobre restrições sociais, jurídicas e judiciárias que tratam do direito para a população pobre, especialmente aquela que vive em favelas, Cláudia assume a vaga do desembargador federal Paulo Espirito Santo, aposentado por idade em junho de 2023. A magistrada ocupa a presidência da 9ª Turma, especializada em Direito Previdenciário.

Depois de confirmar o compromisso de desempenhar com retidão as novas funções, a magistrada, que ocupa a vaga destinada à Ordem dos Advogados do Brasil, foi homenageada por Ana Tereza Basílio. A presidente da OAB/Seccional Rio de Janeiro lembrou que o quinto constitucional representa o acesso aos tribunais de advogados que tiveram contato direto com a população, “que sofrem com agruras e clamam por justiça”, disse Ana Tereza. “Doutora Cláudia, presidente, é um presente para este tribunal. Foi uma grande colega, é uma grande professora e será uma grande magistrada”, elogiou, lembrando num tom descontraído “que todos nós esperamos o retorno dela, porque Claudia está aqui nesta corte por empréstimo”.

Em seguida, representando o Ministério Público Federal, o procurador  Leonardo Cardoso de Freitas, destacou a atuação da magistrada no Direito Civil, em especial no direito à moradia adequada, “um tema muito caro ao MPF e ao TRF2, que conta com a comissão de soluções fundiários”, disse Cardoso de Freitas. Além de ressaltar as qualidades de Claudia Franco, tanto na advocacia como nas universidades, o procurador lembrou de uma música cantada por Gal Costa, ‘seja tenente ou filho de pescador/Ou importante desembargador/Se der presente é tudo uma coisa só/A força que mora n'água/ Não faz distinção de cor’. “A presença da doutora Claudia nesse colegiado representa, sobretudo, uma vitória da luta da diversidade de gênero e da diversidade de orientação sexual. Sinto-me honrado em saudá-la nesses tempos”, afirmou.

Escolhida por Claudia Franco para saudá-la em nome da Corte, a desembargadora federal Simone Schreiber se disse honrada em falar “de uma família linda, que simboliza tanto e nos inspira nessa luta diária que travamos no Brasil para que o amor vença o ódio. Como diz o ministro Barroso, o afeto é revolucionário”. A magistrada lembrou das dificuldades enfrentadas pelas mulheres para conquistarem espaço. “Não basta o mérito, que Cláudia tem de sobra. É preciso muita coragem e determinação”. Simone ressaltou que, já em 2003, Cláudia levantou um tema muito relevante em sua tese de mestrado, o reconhecimento jurídico do afeto, a união de pares homoafetivos. “O STF só foi reconhecer que casais homoafetivos possuíam os mesmos direitos que os casais heteroafetivos em 2011. Isso mostra o pioneirismo da pesquisa de Cláudia. No doutorado e nas pesquisas de pós-doutorado, nossa colega abraçou outro tema importante, as controvérsias entre o direito de moradia nas favelas e o direito de propriedade imobiliária no Rio de Janeiro”, disse a magistrada.

Simone lembrou que o Conselho Nacional de Justiça editou, em 2023, uma resolução que estabelece a ação afirmativa de gênero, visando ampliar a participação das mulheres nos tribunais de segundo grau. “O percentual de mulheres nos tribunais brasileiros era de apenas 21,2%. A chegada de Claudia demonstra que estamos fazendo a nossa parte na ampliação da participação das mulheres em espaços de poder. Ainda há um longo caminho a percorrer, inclusive no que tange a imprescindível representatividade de pessoas negras no Poder Judiciário. Mas hoje damos mais um passo rumo a um tribunal com mais diversidade”, destacou a magistrada.

No começo de seu discurso, Cláudia Franco revelou que às vezes deixa Guilherme Calmon um pouco constrangido. “O presidente me dá muita sorte. E qual a razão? Ele estava na minha banca quando prestei concurso para a UFRJ. Ele não lembra, mas lembro que passei em primeiro lugar e ele falou:- viu? Te dei sorte. O senhor me deu sorte, excelência”, disse, agradecida. A magistrada revelou as sensações que sentiu ao ser nomeada quando, “no primeiro momento, senti alívio. Porque é um corredor longo em que somos testados a cada momento. Não foi fácil conciliar a minha vida pessoal, familiar e profissional. Depois fui tomada por um profundo sentimento de gratidão. Primeiro a Deus. Como uma mulher de fé, sou levada a crer que, nos momentos mais difíceis, o Divino me amparou. Fui apoiada por uma rede generosa de pessoas incríveis, que acreditaram e afiançaram meu nome. Depois veio o temor, um temor reverencial, pela enorme responsabilidade da função. Dormi advogada e acordei magistrada”, confessou.

Ao citar Caetano Veloso para falar sobre a rotina de um advogado, que “vive a realidade diretamente e sabe a dor e a delícia de ser o que é”, Claudia Franco falou sobre o Judiciário que, “a despeito de tantas críticas, ainda é o lugar da esperança para milhares de brasileiras e brasileiros, em especial os mais mineráveis. Ressalto a importância do quinto constitucional. Há a necessidade dos diversos olhares e experiências, fazendo mais saudável o exercício da judicatura. Quero contribuir com a pequena bagagem que trago da vida”, ressaltou. A magistrada falou de seu maior projeto, uma família feliz. “Enfrentamos, Maria, tantos empecilhos. Obrigada por ser essa força, própria das suas raízes nordestinas. Nada foi suficientemente forte para impedir a força que nos une. Como diz Lulu Santos, ‘a gente vai à luta e conhece a dor/ Consideramos justa toda forma de amor’. Nossa filha, meu coração fora do peito, aquela que destrói todas as minhas teses e certezas. E que me fez querer estar aqui. E eu estou aqui. Estou por mim, mas estou por você também, Maria Sofia. E por tantas meninas e mulheres que com humildade, quero ser um exemplo de que o lugar da mulher é aonde ela quiser”, encerrou, contendo a emoção.

Encerrando a solenidade, o presidente Guilherme Calmon destacou que a sessão solene era simbólica, “que ficará na memória desta corte, não só pelas falas, mas pela nova membra, que faz toda a diferença. E é uma oportunidade de mostrar como o sistema de Justiça e, em especial a Justiça Federal, é importante. Quando abri a sessão, utilizei a expressão chegadas e partidas. A desembargadora Vera Lúcia está nos deixando, mas apenas em presença. Porque os votos e manifestações durante quase 30 anos deixam um legado para esta corte”, disse, “E a desembargadora Claudia está chegando, que é uma grande alegria para todos nós”, encerrou o magistrado.

Participaram ainda da cerimônia Wadih Damous, Secretário Nacional do Consumidor; Daniela Pereira Madeira, conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Felipe Santa Cruz, secretário municipal do Governo do Rio de Janeiro, representando o prefeito Eduardo Paes; o juiz federal Eduardo André Fernandes, diretor do Foro da Seção Judiciária do Rio de Janeiro (SJRJ); o juiz federal Rogério Moreira Alves, diretor do Foro da Seção Judiciária do Espírito Santo (SJES); a juíza federal Marceli da Silva Carvalho Siqueira, diretora da Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (Ajuferjes); o general de brigada Ernesto de Lima Gil, representando o Comando Militar do Leste; Eurico Teles, representando o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; a deputada estadual Tia Ju, representando a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; o procurador Glaucio de Lima e Castro, representando o Advogado Geral da União, Jorge Messias e a deputada federal Benedita da Silva, entre outras autoridades.